ARTIGO CIENTÍFICO PIBID COLETIVO


ENSINO RELIGIOSO PARA TODAS AS RELIGIÕES: RELATO DE EXPERIÊNCIA DO PIBID CIÊNCIAS DA RELIGIÃO DA UNIMONTES EM UMA ESCOLA PÚBLICA DE MONTES CLAROS- MG

ISIDÓRIO, Maria Socorro (Coordenadora do PIBID CRE)
BRAGA, Nyura Popoff (bolsistas PIBID)
PEREIRA, Aíngretis Rodrigues (bolsistas PIBID)
SANTOS, Francisco Ribeiro dos (bolsistas PIBID)
VELOSO, John Márcio Peres (bolsistas PIBID)

RESUMO: Este trabalho apresentará um relato de experiências advindo de ações desenvolvidas no Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID, estimulado pela CAPES _ Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e pela Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES, através do curso de Ciências da Religião. Focará a disciplina Ensino religioso (ER) na sala de aula através das falas de estudantes de oitavos e nonos anos, da professora da disciplina e do supervisor pedagógico. Para tal realizamos levantamento de dados através da metodologia grupo focal (GF) que se constitui de um método de levantamento a partir de uma discussão conduzida por perguntas pontuais e realizada em grupo entre seis e dez pessoas pelo menos. Os estudantes solicitados gostaram da dinâmica e apresentaram dados importantíssimos para este levantamento preliminar. Através destes dados objetivamos levantar e conhecer aspectos de ordem prática e teórica, focando como a disciplina aborda o fenômeno religioso. Os dados coletados nos apresentaram parcialmente que, de um lado, a disciplina é conduzida de forma equivocada pela professora, ou seja, há uma tendência evidente em privilegiar a religião Católica nas aulas deixando à margem, demais expressões; de outro lado observamos que não há motivação por parte dos discentes para o diálogo com a disciplina e, pior, nenhuma compreensão acerca da mesma. Destacamos que esta é uma primeira socialização de dados levantados pelo programa que se encontra em andamento.
Palavras - chave: Ensino Religioso - Educação - PIBID.

ABSTRACT: This work will present account of experience that cane of actions developed in institutional program Bursary new teachers. PIBID estimulated by CAPes e coordination of Improvement of people with high level education and by Estadual University from Montes Claros – UNIMONTES, Through Religion course. It will focus the Religious discipline (ER) in the classroom Through of theirs students words from eighth and nineth years, of the teacher’s discipline and teaching supervisor in order to rise informations through of focus methodology group. (GF), that works with a metodo of rise informations, by one discussion conduct by questions and realize in group among six or ten people. The students liked of the activity and showed informations so important to this data preliminary survey. Through these data we had the objective of raise and about aspects of pratical and theorical, focusing on how the discipline show the religious phenomenon. The informations collected showed us one part that, on the other hand, the discipline is conducting by wrong way by teacher, there is one evident tendency to privilege the catholic religion in the classes leaving the bank other expressions, on the other hand we see that there is no motivation among students to dialogue with the discipline and, worse, there is no understanding of it. We empathize that this is the first socialization of the information collected by the program that is working with this.
Key – words – Religious Education – Education - PIBID


INTRODUÇÃO
Este artigo apresentará um relato de experiência do subprojeto “Ensino religioso e Diversidade Religiosa”, do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID, promovido pela CAPES_ Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, do curso de ciências da religião da Universidade Estadual de Montes Claros – UNIMONTES. Os relatos referem-se a ações desenvolvidas em turmas do 7º, 8º e 9º anos de uma escola parceira do subprojeto. As ações são relativas ao subprojeto implantado na escola e objetivaram investigar se a disciplina trabalha a diversidade religiosa em sala de aula. Para tal, realizamos levantamento de dados com a metodologia grupo focal que é um método de coleta de dados através de discussão/entrevista estruturada e orientada em grupo.
Os dados coletados neste primeiro momento apresentaram-nos questões - problemas que nos estimularam a socializá-las. Ressaltamos que pesquisas sobre o ensino religioso escolar em Montes Claros são incipientes, o que trás uma lacuna para o curso de ciências da religião da UNIMONTES, que necessita conhecer o seu campo de atuação. Desse pensamento, ponderamos que este trabalho contribuirá com o curso de ciências da religião.
Antes de apresentarmos os dados e análises, traremos uma breve história do ER no Brasil no intuito de apontar problemas de sua trajetória e que se incrustaram na disciplina e que desde então arvoraram problemas e frutificaram desafios a serem enfrentados e sanados.

1. Abrindo as cortinas: breve histórico do ensino religioso no Brasil

Trabalhar o ensino religioso na escola representa uma ação desafiadora frente a uma série de questões – problemas que o rodeia, como por exemplo, a diversidade religiosa que permeia a sala de aula e a sua não contemplação por parte dos professores da disciplina. Isso é um reflexo da forma em que o ensino religioso foi instituído no Brasil por uma instituição religiosa específica (catolicismo) e com o propósito de impor a sua religião sem considerar a do “outro”, além do seu caráter “não educativo”, sob o ponto de vista pedagógico, entre outras questões, e que, desde sempre gera discussões complexas.
Para falarmos sobre o ensino religioso no Brasil entendemos que é fundamental que façamos um levantamento histórico de como se deu o processo de colonização no País, na tentativa de entendermos não só como a religião Católica que aqui se implantou, como também o ensino religioso.
Antes da chegada dos colonizadores europeus ao Brasil, já existia religiosidades dos povos que aqui habitavam, o ameríndio, gente que tem uma relação muito profunda com a Natureza, uma vez que não se sente separado da mesma, mas unido e participante de um Todo. A natureza, como o ameríndio, é concebida como sagrada; ambos são sagrados e Uno; nesse sentido, esse povo não realiza um religare (religião) como concebemos no homem religioso. Uma forma de expressão dessa cosmovisão se manifesta ricamente através de mitos e ritos.

No entanto, com a chegada das Caravelas portuguesas no século XVI, o cenário religioso do País começa a sofrer alterações, pois ao desembarcar no Brasil, imediatamente esse povo fincou uma cruz e celebrou uma missa, abrindo assim uma vala entre a religião deles e a expressão religiosa do ameríndio, além de lançar no chão cultural brasileiro, outras sementes religiosas, regando-as e cultivando-as compenetradamente. Com essa atitude, o ameríndio teve suas experiências transcendentais ameaçadas, desrespeitadas e tratoradas. Mais tarde quem sofreria com esse mesmo processo seria o africano sequestrado do seu País e trazido para cá.
Após essa entrada invasiva à religião no Brasil, tal fato se intensifica com a intervenção dos Jesuítas em seu propósito de catequizar os ameríndios, tornando-os filhos de Deus; porém, no âmbito trabalhista, há problemas de adaptação/resistência ao trabalho escravo, entre outros; o ameríndio vivia fugindo constantemente, fato facilitado por serem conhecedores das matas ariscas destas paragens. Mas outros virão; um mercado lucrativo que era o tráfico negreiro trouxe para o Brasil povos africanos que perderam a liberdade, mas não perderam a sua fé.

Com isso, surgem novos elementos no fenômeno religioso brasileiro; os africanos que foram trazidos como escravos, além de introduzirem outras expressões religiosas, trouxeram também o islamismo, uma vez que vieram adeptos dessa religião. Os que viviam as religiões de raízes africanas trouxeram consigo as suas crenças que injetavam sentido em suas vidas, sustentando-as, como seus orixás, a crença nos ancestrais, seus ritos e seus mitos, que aqui se misturaram aos dos ameríndios e dos portugueses, arvorando dessa forma uma frondosa mistura de religiosidades
A história mostra, no entanto, que isso não foi fácil e não aconteceu sem dores. No afã de instalar sua religião no País, ouve jogo de interesse por parte dos europeus que convenientemente permitia a com- vivência de crenças dos africanos e ameríndios, misturadas com o catolicismo, promovendo assim um sincretismo religioso . Essa estratégia se deu por vários motivos que não caberia dissertar neste trabalho dada a extensão de fatores e o limite do tema proposto.

A esse respeito, não poderíamos deixar de trazer aqui a contribuição de Montes (1988), que diz que frente a uma série de dificuldades relativas ao trabalho de conversão religiosa, ocorreu por parte dos europeus interesseiros entrelaces de ritos, festas e sagrados. Dessa relação não tanto amorosa, mas ambiciosa, deu-se o processo de sincretismo religioso brasileiro, onde povos com costumes, crenças e culturas diferentes estabeleceram relações, forjando assim um povo com uma pluralidade cultural – religiosa tão exuberante quanto desafiante.
Esse confronto de cosmovisões plantou dificuldades na disciplina, que vem sendo ministrada de maneira distorcida até os dias atuais. E é frente a desafios frutos desse pano de fundo, que o ensino religioso, por ser uma área que estuda o universo religioso, não perde de vista a questão da valorização da diversidade religiosa e cultural do Brasil.

Na Monarquia da Constituição de 1824 o Brasil era um país oficialmente católico; porém 67 anos depois ocorre uma mudança de regime. A 1ª Constituição da República implantava o estado laico. Em tese Igreja e estado estavam separados e a educação também, questão que se tornou desafiadora para o ER brasileiro, pois na laicidade o estado deveria se portar como se não houvesse nenhuma religião que se interpusesse no ensino religioso na educação escolar. Mas isso só em tese. Na pratica até hoje a disciplina é trabalhada com viés confessional- Católico e uma tendência até proselitista . Acresça a isso, a falta de oferta de curso superior preparatório e o consequente despreparo de inúmeros discentes que atuam na disciplina.
Outro desfio é conduzir a disciplina de forma neutra e científica, tendo como fio condutor o princípio da liberdade religiosa, salvaguardado em lei maior, sustentado por outro principio, a laicidade do Estado. Precisamos encarar o problema de frente fazendo valer a lei, sem perder de vista a pluralidade religiosa. Porém, mudanças se impuseram acompanhando a dinâmica de mudanças sociais permeadas por confrontos e inconformações, como podemos verificar no excerto que se segue:

Até o início da década de 1970, a doutrinação religiosa continuava a ser praticada nas escolas públicas brasileiras. A partir de então, a educação passou por uma ampla discussão, devido às mudanças sociais e políticas vivenciadas neste período, principalmente a partir da LDBEN nº. 5.692/71. No âmbito do Ensino religioso, em alguns Estados brasileiros, as reflexões deram origem ao desejo de eliminar o enfoque catequético das aulas, almejando a formação integral dos educandos, por meio de um Ensino religioso ecumênico, que integrasse as diversas denominações religiosas cristãs. (FONAPER, 2012).

Até hoje estas questões persistem assim como a luta por um ER que se quer respeitado em seu estatuto e em sua autonomia educacional, como as demais áreas do conhecimento humano.


2. Ensino religioso na atualidade: alguns pontuamentos

Atualmente no Brasil o ER é um componente curricular obrigatório estabelecido pela Constituição Federal. A Lei de Diretrizes e Bases Nacional regulamenta a disciplina nos seguintes termos da Lei n° 9.475, de 22/07/1997:

O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
§1°- Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores.
§2°- Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso.
O caput 33 instiga à reflexão e o debate quando adverte o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil vedando quaisquer formas de proselitismo e ou intolerância.

Mesmo com esta regulamentação, é fato muitas escolas não se prestarem a fazer uma aplicação correta da lei, ou seja, ordenar suas práticas em vistas à diversidade religiosa do Brasil. Isso colaboraria, no mínimo, com a tomada de consciência relativa ao preconceito/intolerância cultural-religioso, (vizinhos do racismo), e que grassa condutas intolerantes, estremecendo relações sociais e se constituindo barreira de avanço ético no Brasil.
Desse pensar, discutir sobre um ensino religioso para todas as religiões encontra-se justificado frente ao extenso campo da diversidade religiosa no Brasil e à necessidade de contemplar essa pluralidade, jogando-a na bancada do diálogo intereligioso. Um exemplo dessa postura encontramos no FONAPER , que representa:

Uma associação civil de direito privado, de âmbito nacional, sem vínculo político-partidário, confessional e sindical, sem fins econômicos, que congrega, conforme seu estatuto, pessoas jurídicas e pessoas naturais identificadas com o Ensino religioso, sem discriminação de qualquer natureza. Fundado em 26 de Setembro de 1995, em Florianópolis/SC, vem atuando na perspectiva de acompanhar, organizar e subsidiar o esforço de professores, pesquisadores, sistemas de ensino e associações na efetivação do Ensino religioso como componente curricular. O FONAPER é um espaço de discussão e ponto aglutinador de idéias, propostas e ideais na construção de propostas concretas para a operacionalização do Ensino religioso na escola. (FONAPER).

Através dessa associação foi estabelecido o primeiro PCNER ER do Brasil_ Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino religioso_ que visa proporcionar bases para se trabalhar com saberes gerais que compõem o universo religioso; entre outros, deve-se considerar trabalhar os temas a partir das experiências religiosas que compõem o contexto dos educandos; ainda, buscar colaborar com a compreensão sobre o direito à vivência religiosa, assim com à diferença, valorizando a diversidade cultural religiosa presente na sociedade, no constante propósito de promoção dos direitos humanos. (Cf. PCNER, 1997, p.30-31).
Nós das ciências da religião coadunamos com a concepção do FONAPER uma vez que buscamos pautar nossas práxis educacionais na alteridade e diversidade religiosa, abordando o tema de forma científica, dialogada, problematizando, entendendo que o saber sobre esse tipo de conhecimento (religião) e o seu universo conceitual, é de suma importância no quadro dos demais conhecimentos, para a construção de um olhar mais crítico e posturas mais abertas e democráticas por parte das novas gerações.
Esse pensar nos impulsionou a ir de encontro aos sujeitos do processo no intento de olharmos mais de perto as vivências da disciplina na escola e trazer, pela boca dos estudantes, os cismas, problemas e inquietações. É o que veremos a seguir.

3. Ensino religioso na prática: relatos de insatisfação

Neste tópico traremos as impressões de estudantes da escola parceira do PIBID ciências da religião para podermos pegar uma ponta de um fio complexo e, como vemos acima, extensamente problemático. Tal ação se afigura para de nós de grande importância por entendermos que todos os envolvidos devem se posicionar.
As questões abaixo pontuadas são reflexos dos primeiros passos que demos na numa escola da rede pública estadual de Montes Claros, com o intuito de vislumbrar a face e os movimentos da disciplina ensino religioso. Para tal, por se tratar de uma pesquisa exploratória, nos amparamos na metodologia grupo focal (GF).
Um Grupo focal é uma entrevista coletiva conduzida por um mediador em que cada participante expõe o seu parecer sobre a questão em foco; em nosso entender, o GF é uma metodologia muito profícua principalmente quando se deseja obter informações de um grupo de pessoas, sobre um tópico específico.

O objetivo do grupo focal é recolher informações sobre os sentimentos, valores e idéias das pessoas acerca de um assunto específico, e não obter consenso, nem tomar decisões. Os grupos focais podem ajudar a confirmar uma teoria e também a ampliá-la via informações mais detalhadas e orgânicas. Entrelaçaremos aos dados do GF, colaborações de Passos (2007), Ligório (2010), Cortella (2007) e Junqueira (2007), estudiosos de ponta do tema ER no Brasil.
A metodologia (GF) foi aplicada por nós, bolsistas do PIBID/UNIMONTES, do curso de ciências da religião, conforme a proposta do 1°eixo do Subprojeto-Ensino Religioso e Diversidade Religiosa, na escola pesquisada, coordenado pela professora coordenadora do PIBID, no período de novembro de 2011. Ao todo foram contempladas 04 turmas: uma do 7°, duas do 8° e uma de 9° ano do ensino fundamental, contando com um total de 40 estudantes. Porém, pelos limites deste trabalho, não apresentaremos todo o material, mas alguns dados levantados que entendemos serem suficientes para o propósito deste artigo.

Como já pontuado, objetivamos coletar não só dados específicos sobre a disciplina, mas também, capturar das entrelinhas das falas, sentimentos, valores e idéias a cerca da mesma de forma neutra sem ensejar obter consenso.
Nesse sentido, ao levantarmos questões - problemas buscamos através da metodologia, obter informações importantes de referências objetivas e subjetivas. Uma das questões - problemas pontuadas pelos estudantes entrevistados foi o fato dos mesmos acharem o ensino religioso desnecessário em suas formações. Destacamos que a docente de ensino religioso na escola pesquisada é formada em pedagogia, de modo que tal formação já acarreta problema na condução da mesma, como podemos constatar através das falas dos entrevistados. Vejamos suas impressões :

1. O que você mais gosta nas aulas de Ensino religioso?
Estudante A: _Gosto porque fala de Deus, fala do que pode e do que não pode, e também é bom.
Estudante B – Ah, eu não gosto muito não.
Estudante C – Ah, eu gosto quando alerta sobre as drogas.
Estudante D – Olha muitas vezes o professor fala de certa religião, mais das deles, e falam que respeitam a nossa, mas sempre passa um pouco disso aí [imposição de uma única religião].
Estudante E _Gosto quando ela fala assim [confessionalmente]... porque eu mesmo sou católico; ela fala das campanhas de fraternidade... Eu gosto porque sempre ela está falando sobre outras religiões, porém nem todo mundo aceita [esse não aceitar é fruto de intolerância religiosa nutrida no seio educacional e reproduzida].

2- Como vocês gostariam que fossem as aulas de ER?
Estudante A: _Acho que se a gente soubesse de outras religiões seria melhor, mas como a gente nunca viu isso... [postura crítica].
Estudante B: _ Ela fala sobre outras religiões, sobre outras coisas. [Defesa frouxa].
Estudante C: _ [A professora deveria] Tirar a gente da sala, chamar algumas “religiões” para debates com a gente. [desejo de conhecer outras denominações que não só a católica].
Estudante D- [Queriam que a professora] Saísse mais com a gente da sala, para conhecer outras religiões... [crítica ao método só expositivo].
Estudante E: _ Olha, muitas vezes o professor fala de certa religião, mais das deles, e fala que respeitam a nossa, mas sempre passa um pouco disso aí. (Indignação).
Estudante F: _Gosto, porque fala de cada religião. Ela fala para respeitar as religiões.

3- O que vocês menos gostam das aulas de ER?
Estudante A: _ A explicação cai mais sobre a religião católica, e a minha religião é outra; eu respeito na hora de ouvir... [questionamento crítico].
Estudante B: _(...) Deveria falar mais sobre outras religiões, só fala da católica...
Estudante C: _[Não gosto] Dos textos longos, sempre os mesmos temas [sobre drogas] e de não falar sobre outras religiões.

4-Você considera importantes as aulas de ER? Por quê?
Estudante A: _ Acho importante porque aprendemos um pouco mais sobre outras religiões.
Estudante B: _ Aprendo sobre outras religiões e culturas.
Estudante c: _ Aprendi sobre a religião católica. Que na Bíblia Católica tem mais livros do que a Bíblia Protestante.

5- Como vocês gostariam que fossem as aulas de ER?
Estudante A: _ Acho que deveria fazer um passeio, conhecer outros lugares, falar de outras religiões... [Aula de Campo].
Estudante B: _ Que falasse de outras religiões.
Estudante C: _ Dissesse sobre outras religiões. Pois só ouço de duas: a Evangélica e a Católica.
É notória nas falas dos discentes a insatisfação com a disciplina. Isso mostra a falta de entendimento da disciplina por parte de professores que conduzem a disciplina de forma aleatória, como se a mesma não tivesse princípios como as demais. Sobre isso os pressupostos do FONAPER traz o seguinte:

O Ensino religioso, como toda área do conhecimento, tem uma prática docente própria. É o como fazer, sem espontaneísmo ou pragmatismo. Tem uma intencionalidade e uma direção. É o como tratar do conhecimento religioso na sala de aula. (FONAPER).


Outra questão problemática é que na maioria dos casos, o profissional que está atuando nesta função não tem licenciatura em Ciências da Religião, como é o caso da professora da escola pesquisada;
isso acarreta a condução da disciplina de maneira cega e equivocada. Frente a isso sustentamos que as ciências da religião devem ser a base de formação destes profissionais assim como embasar os conteúdos adotados nas aulas de Ensino religioso.
Sobre as discrepâncias apontadas pelos estudantes acerca da unilateralidade de abordagem, Ruedell (2007) diz o seguinte: “O ensino religioso deve conter como tarefa e metodologia básicas a prática do diálogo no mundo plural de hoje, em rápida transformação, a convivência na alteridade e o respeito ao diferente.” (P. 20). Isso impõe um ensino religioso que atenda um princípio de alteridade e que se abra ao diálogo e a uma construção na concepção religiosa de cada ser humano pautados no pluralismo cultural-religioso.
Outra questão que deve ser considerada pelo professor de ensino religioso é que, por mais que predomine uma determinada expressão religiosa no contexto em que ele está inserido, se faz necessário o respeito à diversidade religiosa existente em sala, como pondera Silva:

Estudar os fenômenos e sistemas religiosos como parte da cultura significa apreender um fator identificável da experiência humana, que se apresenta como imagens que passaram através de milhares de pessoas, ao longo de diferentes tradições, algumas nos santuários, outras nas universidades. Até então fomos acostumados a observar a maioria e predominar certa tendência em função da maioria. (...) Nenhuma tradição religiosa é “total”, nem existe um status de favoritismo de religiões. Conhecer o lugar onde estamos e onde os outros estão em relação à fé e as crenças levam-nos a desenvolver um sentido de proporção no amplo campo das religiões, religiosidades, experiências religiosas, onde todos devem ser ouvidos e respeitados. A diversidade se faz riqueza e deve conduzir à compreensão, respeito, admiração e atitudes pacificadoras. (SILVA, 2004, p.5).


A trajetória da disciplina aconteceu através de algumas trocas de roupas ou de modelos de ensino, pautados em tendências ideológicas e norteadoras de práticas, extensão da forma como a disciplina foi instituída no País. O modelo da disciplina até então mais em alta se volta a catequização (modelo catequético). Isso denota a falta de qualificação profissional acadêmica concreta da área, que reproduz erros históricos, causando estranhamentos além de não atender às demandas de sala de aula, conforme vimos acima.
Com isso, simplesmente conduz-se práticas e conteúdos aleatoriamente, sem considerar que a disciplina tem uma epistemologia, conteúdos específicos e objetivos educacionais claros, como reflete Cândido (2008):

Consideramos que a finalidade do ER consiste em possibilitar aos educandos uma ampliação de sua visão de mundo, levando-os a maior compreensão das questões religiosas no âmbito da vida moderna, elevando tais estudos e reflexões à categoria de elementos colaboradores na compreensão e vivência do autenticamente humano e do diálogo na diferença. (P. 114).

Desse entendimento e frente ás práticas distorcidas da disciplina, buscaremos apresentar nos limites deste trabalho, alguns fundamentos que podem ajudar a jogar luz em tais incoerências e nos levar a compreender melhor a disciplina.

4. Modelos de ensino religioso na escola

Especialistas em educação e em ensino religioso explicam a trajetória da disciplina a partir de alguns modelos encontrados na história do Brasil. Na história do cristianismo vemos a sua expansão sendo conduzida de forma proselitista sob o disfarce de disciplina educacional, passando por cima das expressões religiosas do outro.
Além da hegemonia que a Igreja Católica exerce na religião do Brasil e na formação de quadros de religiosos via escola, outras denominações surgem e com elas, mais problemas; sobre isso Passos diz que “Lutero vai publicar seu catecismo em 1529, e muitos catecismos vão surgir inspirados nas formulações do Concílio de Trento, como o de São Carlos Boromeu, em 1566, e o São Roberto Belarmino, em 1597.” (P.56). Após esses Concílios, a catequese se consolida nas escolas com um discurso de formação de idéias corretas, confrontando idéias falsas. O esquema abaixo apresenta as sinteticamente as principais características deste modelo:

TABELA 1: MODELO CATEQUÉTICO
Cosmovisão Unirreligiosa
Contexto político Aliança Igreja-Estado
Fonte Conteúdos doutrinais
Método Doutrinação
Afinidade Escola tradicional
Objetivo Expansão das Igrejas
Responsabilidade Confissões religiosas
Riscos Proselitismo e intolerância
Fonte: PASSOS, 2007, p.59.

Este modelo não considera a diversidade religiosa existente em sala de aula; um dos motivos é que neste contexto não existem pessoas de uma única religião. Outra questão é que o profissional não está habilitado de forma axiológica e acadêmica para lidar com todas as denominações existentes em sala.
O modelo catequético atende a uma específica doutrina de uma determinada religião; com isso trabalha-se uma doutrina e uma aceitação. Essa atitude, que não é educacional, acontece nas igrejas, pois em cada denominação religiosa encontram-se pessoas formadas em sua doutrina e que tem a finalidade de repassar/reproduzir os ensinamentos para neófitos. Nas igrejas dá-se o nome a este procedimento de escola dominical, formação religião, doutrinação, catequese e outros nomes de acordo com cada religião. Portanto não se trata de educação e seus norteamentos científicos e pedagógicos.

O segundo modelo é o teológico, que parece uma complementação do modelo catequético. A teologia desse ensino religioso se baseia numa visão religiosa mais atual, que, em tese, busca ultrapassar a visão unilateral de cristandade e de expansão proselitista, oferecendo um discurso religioso e pedagógico a uma comunidade com convicções religiosas diversas, promovendo um diálogo entre as religiões.
Como veremos na tabela a seguir, o esquema representa ainda um modelo que não é adequado à sala de aula por não atender de fato a uma cosmovisão transreligiosa. Sua fonte teórica não é das ciências da religião, considerada base cientifica para tratar o fenômeno religioso em nível educacional, de investigação, pesquisa, etc. Além disso, seu objetivo não atende a uma formação integral, mas a uma formação religiosa. O risco deste modelo é ser uma instrução religiosa, diferente do propósito das ciências da religião que mantém uma neutralidade cientifica. Vejamos as peculiaridades deste modelo:

TABELA 2: MODELO TEOLÓGICO
Cosmovisão Plurirreligiosa
Contexto político Sociedade secularizada
Fonte Antropologia, teologia do pluralismo
Método Indução
Afinidade Escola Nova
Objetivo Formação religiosa dos cidadãos
Responsabilidade Confissões religiosas
Riscos Catequese disfarçada
Fonte: PASSOS, 2007, p. 63.
O terceiro modelo é o das ciências da religião. Muitos estudiosos propõem o modelo das ciências da religião como adequado por se tratar de um ensino que atende à sociedade pluralista e intercultural, entendendo que o conhecimento religioso é um patrimônio da humanidade. Sobre isso, Passos (2007) argumenta que:

O modelo das Ciências da Religião toma como pressuposto do ER a educação do cidadão. O estudo da religião na mesma seqüência e intensidade das demais disciplinas visa à educação dos sujeitos a fim de que vivam responsavelmente em sociedade. (P.10).

TABELA 3: MODELO DAS CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
Cosmovisão Transreligiosa
Contexto político Sociedade secularizada
Fonte Ciências da Religião
Método Indução
Afinidade Epistemologia atual
Objetivo Educação do cidadão
Responsabilidade Comunidade científica e do Estado
Riscos Neutralidade científica
Fonte: PASSOS, 2007, p.66.

Reforçamos que pilastrando nossos ordenamentos na epistemologia das ciências da religião entendendo que na instituição escolar se faz necessário uma abordagem científica do fenômeno religioso e não catequética, pois a lei assegura a todos o direito de conhecer as diversas expressões religiosas à luz das várias ciências que ajudam a elucidar o tema. Pensamos que esse entendimento evita a perplexidade dos estudantes ante o fato de que, apesar da diversidade religiosa estar presente na sala ela não é contemplada/respeitada.

Daí questões escapulirem das vozes dos estudantes, escoando das entrelinhas das suas colocações, como: porque trabalhar a disciplina ensino religioso sob um único enfoque, uma única religião? Porque não ensinar a todos a cerca das religiões existentes? E, pra que essa disciplina sem sentido nenhum?
Nossa concepção religiosa é construída de porcentagem européia, portuguesa, africana, americana e outras mais. Como ignorar essas matrizes existentes em nossas manifestações religiosas? A proposta é que todos tenham o seu direito respeitado e que a sua opção religiosa não seja vítima de bullyng. Uma criança em sua experiência religiosa que advém do seu berço familiar, não pode ser ignorada em uma sala de aula. E Isso acontece quando determinada escola impõe um modelo catequético ou teológico a ser trabalhado por um profissional em sala de aula. Foi isso que observamos na escola pesquisada, um modelo catequético, enviesado para o cristianismo católico. Como ficam a opção religiosa dos estudantes que são filhos de pais protestantes, pais espíritas, afros e outros mais?

O modelo a ser proposto na escola pela via do PIBID por nós acadêmicos do curso de ciências da religião – UNIMONTES será conforme as diretrizes desta área de conhecimento humano. Entendemos que o profissional da disciplina deve passar pela formação correta da sua área. Em nosso caso, em ciências da religião, nos qualificamos para discutir científica e criticamente aspectos da dimensão religiosa que compõe a existência humana; aspectos como a relação humana com o transcendente; o papel do religar humano com uma instância superior, o poder da fé na cura de doenças; religião enquanto porta de acesso às mais profundas questões a cerca do sentido da vida, entre outros.
Com este entendimento e engajamento, ensejamos abrir portas para uma inovação curricular ressignificando a disciplina ensino religioso na escola. Com a prática de respeito à liberdade religiosa, pensamos que conseguiremos lançar sementes que possam fazer brotar práticas educativas mais corretas. Nesse sentido conformamos nosso pensar ao de Passos, quando aponta uma possível forma adequada de se trabalhar ensino religioso e seus temas em sala de aula:

Do ponto de vista teórico, a religião deve ser tratada como um objeto de estudo importante para a educação, um componente que contribui com a formação geral do cidadão, assim como outros que integram os currículos do ensino fundamental. Uma metodologia correspondente e coerente com essa concepção rompe com as reproduções confessionais de cunho catequético e, talvez, com a concepção que coloca o aprimoramento da religiosidade como pressuposto inicial do ER. (2007, p. 36).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com este artigo buscamos apresentar relatos de insatisfações em relação ao ensino religioso, de estudantes entrevistados numa escola pública da cidade de Montes Claros, parceira do PIBID ciências da religião da UNIMONTES. Pelo que vimos e ouvimos o conteúdo de ensino religioso trabalhado em sala de aula, não aborda o conhecimento das religiões em seus variados temas como o sagrado, cosmogonia, cosmovisão, rito, mito, alteridade, diversidade religiosa, etc. Observamos a necessidade do docente da área estar habilitado para contemplar corretamente as demandas da turma e para melhor conduzir a disciplina.
Muitos discentes entrevistados não são católicos, e mesmo os que são, desejam ampliar o conhecimento em relação às outras religiões existentes. Conhecer a existência de outra religião, entre outras coisas, pode despertar a consciência de que nem todos professam uma mesma religião, que toda e qualquer pessoa tem o direito de experienciar e informar sua religião, que todos devem ser respeitados em suas opções e vivências religiosas. Os que não são católicos questionam por que se fala com ênfase somente do catolicismo.
Frente aos dados levantados verificamos que há muito o que fazer relativo à implantação de um ensino religioso não catequético na escola pesquisada. Por hora não apresentaremos resultados frente às questões, pois estamos ainda caminhando como o projeto na escola. Porém, estes relatos de insatisfação serão valiosos “guias” em nossa trajetória do PIBID na escola. Eles nos ajudarão a enfrentar as barreiras do desconhecimento epistemológico e do descaso com a disciplina na escola. Isso nos motiva ainda mais.

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